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terça-feira, 25 de maio de 2010

Humor levado a sério


Matéria publicada em O IMPARCIAL, em 22.05.2010, sábado. Quem por algum motivo não pôde ler - deve ter sido pq acabaram-se os exemplares nas bancas - agora pode! Segue meu primeiro texto na capital federal =)


BRASÍLIA – De boné, camiseta branca, calça jeans e tênis, ele chega. Como um personagem congelado saído direto da sala de aula para a entrevista. O jeito maroto do menino não parece combinar com o trabalho de gente grande. Mas se encaixa bem. Danilo Gentili, o garoto que queria ser diretor de cinema, é hoje humorista, repórter do CQC, na rede Bandeirantes , cartunista e até compositor. Mas o ofício, digo, a missão prioritária do paulista de 30 anos é uma só: buscar a verdade, custe o que custar.

O segredo da admiração conquistada e do trabalho que desenvolve, ele conta. “Acho que humor é uma questão de comportamento e verdade. A base da comédia, a melhor matéria-prima dela, é a verdade. Quando mexo com os políticos, com a reação real deles, quando eu escrevo um texto, em tudo o que eu faço, procuro fazer com verdade”, enfatiza.

Pernas longas, caminha muito rápido. Anda muito, vai longe e em pouco tempo. E as aventuras e surpresas reservadas pela vida exercem um certo poder sobre ele. “Eu gosto muito de trilhar caminhos novos. Isso me atrai”. Quando pensou em que formação queria ter, buscou um curso de graduação que pudesse se aproximar ao que de fato almejava. “Eu sonhava fazer cinema. Mas eu só tinha dinheiro pra fazer essa faculdade [Publicidade]. Eu queria ser diretor. Aqui no Brasil é muito difícil fazer cinema. Só se faz filme com dinheiro do governo. Quem sabe um dia eu encare o cinema”.

Enquanto isso, a polivalência rende bons frutos. Trinta músicas inéditas – que ele pretende que sejam um dia gravadas, quadros na televisão de repercussão e carreira consolidada como um dos pioneiros do stand up comedy (comédia em pé) no Brasil. No mundo do stand up, ele iniciou em 2005. Era uma paixão latente: em ponto de explosão. Procurava o formato por aqui, mas não encontrava. O pavio foi aceso quando ele descobriu o Clube da Comédia. “Eu sempre via filmes, seriados, e isso me atraía. O cara sozinho, com a roupa do corpo, fazendo as pessoas rirem. Então, comecei a procurar por aqui algo semelhante. Mandei um texto para a Marcela Leal. Ela gostou e me chamou”. O chamado para o CQC veio após a produção do programa assistir a uma de suas apresentações de stand up. “Foram me ver no bar e me convidaram”, diz.

Modo “solo”

Uma das mosquinhas prediletas do público, Gentili se vê pronto para ingressar em mais um projeto: um late night, elaborado por ele, que deverá ganhar corpo e entrar no ar em outubro deste ano. “Talvez no segundo semestre, por volta de outubro, ou mesmo em 2011. Acho que há possibilidade de depois da Copa, ir ao ar”, esclarece. O programa terá o mesmo formato dos bem-sucedidos norte-americanos, já tradicionais e consolidados, com quadros de humor, variedades e stand up. “Agora, estamos trabalhando nisso. Nas ideias, no elenco. Quanto ao nome, não temos ainda. Achava legal ‘Altas horas’, mas o Serginho [Groisman] já usa”, lamentou.

Sondado pela rede Record para participar do humorístico Legendários, ele recusou. “Conversei um tempo sobre o programa com a Record. Quando ficou mais visível o que seria o projeto, optei pelo CQC. Foi um convite que eu analisei com muito carinho, mas preferi permanecer no CQC. Foi o CQC que me deu uma chance, e eu tenho orgulho e gratidão em fazer o programa aqui no Brasil”, afirma Gentili. O ano de eleições e Copa também favoreceram a opção pela permanência na Bandeirantes. “O CQC é muito forte na cobertura disso. Eu não queria ficar de fora”, completou.

Humor sério

A fuga da formalidade não é completa; existem casos em que a postura é necessária. Com o terno preto e de gravata, Danilo Gentili usa humor para falar de assunto sério. A cobrança pelo cumprimento das leis, por exemplo, e a coragem que intimida – e até o antipatiza diante dos políticos – são dignas do homem feito.

Os temas densos como política e cidadania ditam a tônica dos quadros que o repórter faz atualmente no CQC. No “Proteste já”, ele se reveza com Rafinha Bastos e, ao mesmo tempo em que ouve as reclamações populares, cobra respostas das autoridades. Já o “Cidadão em ação” foi criação do próprio Danilo, com a intenção de aferir o comprometimento e a responsabilidade social dos brasileiros uns com os outros e com a lei.

A vivência nos quadros e com os políticos leva Gentili a uma análise diferenciada, de ambos os lados. Para ele, a realidade do país, inclusive dos políticos, é em parte reflexo da população. “Acredito que eles [os políticos] representam bem o que o Brasil tem. Lá no Congresso, por exemplo, digamos que existam 20% de pessoas honestas, preparadas: a minoria. Tem uns 30% de pessoas burras. Burras mesmo. E uma parcela de aproveitadores também”, opina. “Os que chegam lá ao poder e mantêm o plano de cumprir o que disseram é proporcional à população. Afinal, é ela que os põe lá”, lembra.

Quanto às preferências de cobertura, ele é prático: “Gosto mais de Brasília, de cobrir política aqui”, diz. No ano passado, Gentili frequentava o Congresso Nacional mais intensamente. Com o programa novo de Rafinha Bastos, “A Liga”, e os novos quadros do CQC, houve reposicionamento dos repórteres e Mônica Iozzi foi a nova designada para entrevistar os políticos.

O jornalismo desenvolvido por aqui é audacioso, segundo ele, mas esbarra nas políticas editoriais dos veículos. “Não acho que há covardia nos repórteres de hoje. Eles investigam, descobrem, denunciam passo a passo os esquemas e narram tudo aquilo nos jornais. O repórter brasileiro tem coragem. O problema é que às vezes ele é empacado na edição do jornal. Tenho a impressão que todo meio de comunicação tem rabo preso com alguém”, alfineta.

Com tato

A dissociação entre o trabalho e o atendimento ao público é difícil. O lado adulto costuma falar mais alto. As recepções são variadas. “Eu estou sempre esperando pedra na mão. Aí, quando vem carinho é mais fácil, né?!”, brinca. Entretanto, o respeito à produção das matérias e a responsabilidade com o trabalho nem sempre são bem encarados por quem quer estar pertinho. “Tento atender todo o mundo, dar atenção, mas nem sempre é possível. Às vezes, estou fazendo matéria e tenho que ficar bem quietinho. Fico parado, para que os seguranças não me notem. Mas aí vêm flashes, fotos, eles percebem e isso me atrapalha. Algumas pessoas acabam pensando que sou estrela, metido, mas não. No Congresso, eu viro meio ponto turístico”, revela. O publicitário de Santo André explica que geralmente tenta contornar a situação e ser diplomático. “Preciso ter um jogo de cintura e não irritar minha equipe – eles não tem a obrigação de tirar foto ou dar autógrafos – e também não chatear o público”, pondera.

Menino mau?

A versão menino de Danilo tem uma espécie de retrato. O livro lançado este ano, “Como se tornar o pior aluno da escola”, conta histórias da vida dele, com dicas e planos de fuga e peças a serem pregadas no ambiente colegial. “Eu queria fazer um livro só com os planos, que hoje ficam no final dele: os desenhos. Aí o Marcelo Duarte sugeriu que eu fizesse maior, que expandisse. Então, comecei a contar o que eu fazia na época de escola”.

A repercussão em torno da produção literária de Danilo aumentou quando pais de alunos entraram com uma ação contra a temática e o Ministério Público tornou a publicação recomendada apenas para maiores de 18 anos e solicitou o acréscimo de um selo com tal restrição. “Costumo brincar sobre isso, que meu livro é o primeiro proibido justamente para o público alvo”, comenta. “Não fico chateado com isso, não. Até porque está vendendo bem mais agora. E os pais, os adultos, pegam o livro e até vão se lembrando do que também fizeram no tempo deles. Eles lêem e se identificam”, finaliza. Ele conta que quando idealizou o livro, pensou em levar entretenimento, mas não nega que haja um quê crítico. “A intenção foi mais de fazer algo para se divertir, mas também há um pouco da minha opinião sobre a educação no Brasil. Mas isso está diluído, dissolvido dentro do texto”, explicou.

Além dos temas intrigantes sobre os quais trata, a irritabilidade que causa nos políticos e o humor sarcástico o fazem ser classificado como polêmico. Rótulo com o qual ele não concorda. “Sou humorista. Faço piadas, não polêmicas. Entendo que o papel do humorista é fazer piada. E quem fala mal do que eu faço não pagaria pra ir ao meu show. O meu público me entende”. Parece ser o que basta.